LADO DE FORA
sobre o livro fantasias para quando vier a chuva, de Samantha Abreu
Fantasias para quando vier a chuva é um livro em que a poesia caminha em cima do muro, lutando entre o lado de fora e o lado de dentro. Todo feito de imaginação caprichosa, vestindo disfarces de bom gosto e tons fortes para enfrentar a chuva, que aqui é o desfeito mundo das não-fantasias.
A poesia da Sá recusa-se à quarta-feira de cinzas, fabulando versos que não escorrem, mas sacodem as poeiras da vida. Confetes de encantamento e cores de extasiar enfeitam as páginas do livro que está ambientado no baile de máscaras em que as palavras se trasvestem, envoltas pela serpentina do dizer.
O livro, que está dividido em cinco temas, trabalha o embate entre si e consigo em “O Silencioso Recôndito”...é derramamento de uma melancolia que só compreendemos e sentimos em dias chuvosos, como acontece no poema O avesso: “Aqui fora, claridade./ Mas o avesso está coberto de sangue.”.
Os bocados femininos que foram pulverizados pelos dedos de Samantha Abreu encontram-se em “Bonecas Suspensas”, assim assim: “E da ponta dos dedos da menina, luzes se decompõem poeticamente no universo.” (Mãos de Medusa). Mas, Pandora é a síntese do que está escondido debaixo dos panos da estreante poeta (nova feiticeira?), que abandona a escuridão: A]breu[.
A londrinense mata o real em “Onírico Enleio”: “Meu mar de mortos: ‘negro purgatório de ensejos aniquilados’” e adorna-se de aspirações em “Irrepresável Vira-Ser”. Mas é em “A Rubra Desordem” que o amor é “terra de ninguém” ou desencaixe ou “Uma história sem pé nem cabeça.”. Todos os guarda-chuvas aparecem na passionalidade (in) (a) (p)...algumas gotas penetram o tecido e inundam de lirismo e torpor quem se atrever a reconhecer-se: “– Você consegue ver, ele disse,/ que onde me começo/ te termino/ e que não há mais espaço/ pra ser você em você mesma?”.
A obra que trata de “tudo o que desorganiza” merece ser vista e vestida porque nada do que desfila em seus versos é verdade. Samantha Abreu arquiteta um cantinho cheio de deliciosas mentiras tão insubordinadas que acabam por criar outra realidade mais oportuna, bem mais digerível que a nossa...mais afortunada.
Cair das nuvens aqui é pisar em versos, pegar quimeras e salvar-se das tempestades.
Referência:
ABREU, Samantha. Fantasias para quando vier a chuva. Rio de Janeiro: Multifoco, 2011.
Sobre a autora:
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