11/01/2010

o tempo visto pelas mãos de Ernani Fraga

foi uma alegria receber o primeiro poema do ano de um grande amigo. Ernani Fraga é de uma delicadeza que só a poesia pode explicar. ou, desexplicar de vez.
fiquem com ele dentro deste.


TEMPO

tempo...

substantivo magro, malogro masculino,

amálgama desatento com delicadeza áspera

de cheiro de chuva na terra

madeira verde no fogo

memória do pó, da pedra, do excremento,

escarafuncha

o chão

dos horizontes findos

a poeira é a

do amestrador de silêncios

são lírios

de sons em asas líquidas, escorre

- de joelhos, contrito –

pelos tijolos lúbricos,

engonços, rachaduras,

ternuras e vilezas

no frontispício do momento súbito,vago, poliédrico

de ave, de peixe, de amante, tronco ou árvore

ontem

: voeja

flor de corte e solo misturado

: finca

no coração ardor de prego

em brasa no palor líquido, incompressível

nos ângulos dos vôos livres

mas fibrila

a tarde amarela, agiganta

- repentino - o que por bem tinha calado

ou feito pequenino

e é por isso

é por isso que há tempos

no tempo eu exista assim

inclemente, impenitente, verbo velho,velhaco,

insubsistente

paisagem assimétrica, monturo,

mutante (incoerentemente sempre menino)

na espiral constante da embriaguez adunca que ora é pressa

ora é eternidade

ora não passa nunca


Foto de Carlos Savasini


ERNANI FRAGA, paranaense de Campo Mourão, é advogado formado pela Faculdade de Direito de São Bernardo do Campo/SP. Atuou como ator nas peças A Falecida, de Nelson Rodrigues, e Fando e Lis, de Fernando Arrabal, ambas sob direção de José Luiz Sconi; e na peça infantil Um elefantinho incomoda muita gente, de Oscar Von Phul, sob direção de Luis Camargo; Foi membro de Marcas Nossas – Grupo de Arte, tendo publicado, em parceria com Sueli de Souza e Edson Natuesper, o livro Marcas Nossas, cujos poemas deram ensejo à montagem do espetáculo Recital Noturno nº 1, levado à cena pelos próprios poetas na Casa de Chá Erva Doce, em São Paulo. Participou das antologias Exóticos e Livres, Contos de Fim de Século e As Várias Faces da Morte, com os contos intitulados A última Palavra, Uma notícia para Deise e Rachel. Colaborou com as publicações santistas Mirante, Zênite, Poetizando e Cabeça Ativa, em cujas páginas teve poemas publicados. Foi membro do Clube de Poetas do Litoral. O seu poema Cartas foi publicado no Informativo Cultural Clips n. 14 da Secretaria de Cultura de Santos/SP. É autor de Ponte Necessária e Vermelho (de poesia) e das peças teatrais O Caos das Coisas, Uma ilustração Farsesca, Títeres e o O Pai e os filhos. Tem textos publicados em jornais e em sites na internet. Foi membro do Centro Contemporâneo de Dramaturgia, dirigido por Paula Chagas Autran. Foi membro do grupo de poetas Rascunhos Poéticos, coordenado pelos poetas Carlos Savasini e Osvaldo Pastorelli, na Casa das Rosas, em São Paulo. Em 2009 dirigiu a leitura encenada de contos Eu também sou Maria, de Leonel Possatti. Vive em São Paulo desde 1971.