01/10/2009

Marco Vasques e a lágrima de pedra


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“Caiu-me o olhar para a límpida fonte;

Que logo desviei, colhendo a ver a

Imagem da vergonha em minha fronte.”

(Dante in Purgatório, canto XXX)

o metal na veia orquestra os órgãos

e desenhos no monturo se acumulam

coração pulmão fígado e voz entram

espontâneos na faca que expia a artéria


e bate no peito um esquife dobrando

a esquina acompanhado pela multidão

com lágrimas de pedra e ranger de

madeiras nas pernas de mortos vindouros


um copo de ácido na saliva

não corrói o aço da faca na garganta

e nem impede o corte vertical

da lâmina que divide a língua


e faz surgir do homem um copo

de vinho dividido em leucócitos e

eritrócitos que escorrem nos dias e nas noites


do outro lado da cidade

encontro outros órgãos longe

da orquestração cotidiana

porém próximos dos risos dos revólveres


e na absoluta solidão

grita a filantropia de um coração andarilho

no desejo de construir uma orquestra sinfônica

em que as facas não sangrem o violino

e a cadeira de rodas posta à frente do piano

não emane a mesma e única música

que ecoa na calmaria dos lagos

onde dormem afogados

meninos com suas canções de ninar

jovens guitarras elétricas homens

mulheres anjos demônios mísseis

moedas cédulas prédios carros

placas de advertência e a desconexão

completa dos dedos sujos de pólvora


no aborto dos órgãos só varia

a estupidez humana em aperfeiçoar

os acordes da vida

quando se está condenado a

tocar sempre a mesma nota


(Marco Vasques in Elegias Urbanas, Bem-te-vi, RJ, 2005)



Marco Vasques é poeta e crítico de poesia. Bacharel e licenciado em Filosofia pela Universidade Federal de Santa Catarina. Faz mestrado em Filosofia da Linguagem. Autor de Elegias Urbanas (Poemas, 2005, Bem-te-vi, Rio de Janeiro), Diálogos com a literatura brasileira – volume I (entrevistas, 2004, EdUFSC/Movimento, SC/RS), Diálogos com a literatura brasileira – volume II (entrevistas, 2007, EdUFSC/Movimento, SC/RS) e Harmonias do Inferno (contos, 2005, edição do autor). Tem no prelo Flauta sem Boca (poemas) e trabalha no Diálogos com a literatura brasileira - volume III. Nasceu em Estância Velha, 1975, vive em Florianópolis, mas é de Imbituba, onde passou a infância.

Acaba de publicar (01/10/09) a antologia poética Poesia para gostar de Poesia, com seleção e textos dele e e de Marcos Vinícus Scheffel. A opção por lançar numa escola tem a ver com a natureza do projeto, pois se trata de uma antologia de poetas de Joinville. O livro vai ser distribuído gratuitamente às escolas através de parceria feita com a Secretaria de Educação da cidade. O poeta e crítico de poesia Marco Vasques vai falar sobre a produção poética da joinvillense para alunos e professores com o objetivo de apresentar os poetas da cidade para a cidade. São 15 poetas ao todos: Fernando José Karl, Ramone Abreu Amado, Rubens da Cunha, Clotilde Zingali, Alcides Buss, Marcos Alqueire, Caco de Oliveira, Cristiano Nagel, Dúnia de Freitas, Carlos Alberto Correa, Patrícia Hoffmann, Rita de Cássia Alves e Valmir Capim, Marinaldo da Silva e Silva e Paulo César Ruiz.

Este livro só foi possível graças ao SIMDEC - Sistema Municipal de Desenvolvimento à Cultura de Joinville e Fundação Cultural de Joinville. Toda a edição será distribuida gratuitamente.

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